(21 de setembro de 2014)
Antes restrita a poucas categorias, a concessão de
direitos aos trabalhadores homossexuais tem se espalhado nos últimos anos por
diferentes convenções coletivas. Grupos como o dos químicos, bancários e, mais
recentemente, de metalúrgicos e agricultores têm incluído em seus acordos
cláusulas que vão da extensão de benefícios aos parceiros à licença casamento e
licença adoção.
O acesso dos trabalhadores a esses direitos, contudo,
ainda é bastante limitado em algumas áreas, de acordo com as entidades
sindicais. O preconceito e a falta de instrumentos dentro das empresas que
resguardem a intimidade dos funcionários muitas vezes inibe pedidos de inclusão
do benefício, dizem.
Esse é o caso dos aeroviários de Porto Alegre. Diante
da resistência das entidades patronais, a categoria recorreu ao Tribunal
Superior do Trabalho (TST) para assegurar, em 2011, a inclusão das cláusulas
que garantem, além da participação do dependente no convênio médico, o direito
aos parceiros de usufruir dos descontos em passagens aos quais os funcionários
das aéreas geralmente têm direito. Nos últimos quatro anos, contudo, apenas
três trabalhadores da base do sindicato entraram com pedido de inclusão do
companheiro, conta Leonel Montezana, diretor da entidade, que atribui ao medo
do preconceito a baixa adesão.
Os químicos de São Paulo vivem situação parecida. A
cláusula que garante aos parceiros de trabalhadores homossexuais todos os
benefícios previstos a dependentes legais já vigora há seis anos. Osvaldo
Bezerra, coordenador geral do sindicato, afirma que a pauta entrou no dissídio
a pedido de trabalhadores que na época queriam incluir os companheiros no plano
de saúde, mas que a extensão, mesmo depois desse tempo, ainda é limitada.
Para contornar essas restrições e garantir a
privacidade dos trabalhadores, o Sindicato dos Bancários de São Paulo acordou
com as entidades patronais que os pedidos fossem feitos diretamente aos
departamentos de RH. "Nem os chefes diretos ficam sabendo", conta
Juvandia Moreira, presidente da entidade. A extensão de direitos ao parceiro
começou a valer em 2009 para a categoria, que desde então já conseguiu
adicionar novas cláusulas de igualdade, entre elas a licença casamento e a
licença adoção.
O diálogo aberto e constante da chamada "mesa de
igualdade" fez com que o sindicato se envolvesse em outras questões e
sofisticasse o diálogo sobre os direitos dos trabalhadores homossexuais.
"Intermediamos o caso de um funcionário de banco que, após as férias,
voltou ao trabalho como mulher. Junto ao serviço de assistência social, o
sindicato discutiu desde questões práticas, como qual banheiro o trabalhador
iria usar, e ajudou na conversa sobre discriminação com a equipe da
agência".
Para Reinaldo Bulgarelli, sócio-diretor da Txai
Consultoria, que atua na área de responsabilidade social, os sindicatos
chegaram atrasados a um debate que começou dentro das empresas. "As
primeiras iniciativas vieram dos departamentos de recursos humanos, os
sindicatos ficaram a reboque", afirma.
O consultor ressalva que a extensão de direitos ao
parceiro nos casamentos homossexuais não precisaria ser pleiteada nas campanhas
salariais. Ela se tornou um direito previsto em lei desde que o Supremo
Tribunal Federal (STF) reconheceu, em 2011, que era inconstitucional que se
fizesse distinção de tratamento legal às uniões estáveis constituídas por
pessoas de mesmo sexo. Em maio do ano passado, o Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) ratificou essa decisão e determinou em resolução que as autoridades
competentes não podem recusar a habilitação e celebração de casamento civil ou
de conversão de união estável em casamento entre homossexuais.
O Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) foi
pioneiro nesse sentido, lembra Bulgarelli, ao assegurar ainda no ano 2000 a
equiparação de uniões estáveis hetero e homossexuais para a concessão de
benefícios previdenciários, como pensão em caso de morte. O Conselho Nacional
de Imigração também saiu na frente quando, em 2008, lançou uma resolução
normativa prevendo a concessão de visto ou autorização de permanência aos
companheiros e companheiras de imigrantes em união estável, sem distinção de
sexo.
Para ele, a disseminação através dos sindicatos,
ainda que lenta, é importante porque "dá escala" e aumenta o alcance
das novas garantias a que esses trabalhadores podem ter acesso.
A história dos fruticultores do Rio Grande do Norte
é, nesse sentido, exemplar. A primeira reação do representante das entidades
patronais ao tema, quando proposto pela categoria, foi um surpreso "e isso
existe?", como conta Francisco Ascendino das Chagas, o Guto, do
Sintrafrut. A inclusão da extensão de benefícios ao companheiro legal, também
neste caso, veio do pedido de alguns funcionários, há cerca de três anos.
"Explicamos que isso existe, sim, em qualquer lugar e em qualquer
categoria", completa o presidente da entidade, que representa quatro mil
trabalhadores e tem sede em Assú, interior do Estado.
Os metalúrgicos de Campinas também enfrentaram
resistência das empresas. "Nosso meio ainda é bem machista", comenta
Jair dos Santos, presidente do sindicato. Ainda assim, desde 2011, além da
extensão de benefícios, foram aprovadas a licença de seis dias para casamento e
para casais adotantes. Como a convenção coletiva dos metalúrgicos do município
é feita em conjunto com sindicatos das cidades de São José dos Campos, Santos e
Limeira, os direitos impactam 170 mil trabalhadores.
Essas novas garantias estão na lista do que o
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese)
chama de "cláusulas sociais emergentes", motivadas pela adaptação do
mundo do trabalho às mudanças da sociedade e do sistema produtivo. De acordo
com José Silvestre de Oliveira, coordenador de relações sindicais da entidade,
eles começaram a aparecer já em 2009 entre categorias com maior escolaridade e
mais ligadas à classe média, como a dos bancários, e tendem a se estender pelas
demais áreas.
Fonte: Valor Econômico, por Camilla Veras Mota, 19.09.2014,
disponível em:
http://www2.valor.com.br/brasil/3702514/homossexuais-ampliam-direitos-trabalhistas
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